abril 20, 2006

'Cá um veijinho, filhinha!

Sempre que vou a casa dos meus avós e por lá fico umas horas, entre rebuçados, bolos, naperons e "Canção Nova", aparece sempre uma Dona Luzinete da vida, para botar a conversa em dia e para ver a netinha (eu...) que, para não variar, já está tãaaao cresciiiiidaaaa!!
"'Cá um veijinho, filhinha!! Que 'táis taum vunita, amori. Mas 'táis mais gordita, num tais? Ai que safada, que lhe andas a dar nos volos, néi?"
Ao que eu respondo, timidamente...."pois...". E lá me espeta contra os seus terríficos melões, enquanto me suga uma das bochechas.
Além de ficar a saber que, invariavelmente, estou mais gorda, gosto principalmente da parte em que me confrontam com perguntas como "Não te lembras de mim? Lembras não lembras? Eu ensinei-te a fazer umas pegas!"...E eu, sem tirar os olhos da televisão, duma notícia que realmente me estava a interessar: "...pois....se calhar....tavez...a sua cara não me é estranha, sabe?.."
E quando eu me refiro a uma Dona Luzinete...essa Dona Luzinete existe mesmo, efectivamente! E, efectivamente, essa senhora, além de gorda que nem uma leguminácia provinda dum milagre do Entroncamento, é uma paroquiana devota e agricultora autodidata.
Hoje em dia a simpática senhora já não vai lá com tanta frequência,...é que certo dia, em tempos natalícios, além de nos aparecer com umas uvas da sua própria cultura, que achamos execráveis (não consegui evitar a cara de nojo), trazia o "menino" a beijar. Quando um dos meus irmãos se recusou a levantar do sofá dizendo "Não, não, eu não preciso disso!", seguido dum riso satírico, Dona Luzinete olhou-nos com um ódio profundo enquanto baixava o menino de gesso, nem gesto de total desilusão. Olhou para a minha avó, que abanava a cabeça envergonhada, e virou costas. Nunca mais vi Dona Luzinete...
Mas não fiquem tristes, porque na paróquia da minha avó o que não falta são senhoras destas. E ainda no outro dia tive de "fazer sala" a uma tal de Dona Maria que me descrevia o drama do filho que tinha um pêlo encravado no cú, enquanto abanava hábilmente as chaves que trazia numa mão e um saco de plástico dobrado na outra ("qué para ir ao Súper"...) . Epah...é que foram mesmo estas as suas palavras...um pêlo..encravado..no cú. MAS O QUE É QUE EU TENHO A VER COM ISSO?!!
No dia seguinte, quando vi o pobre do filho, que até é um gajo jovem e desempoeirado, não pude deixar de pensar "Não fazes ideia do que eu sei sobre ti!"
E ela não se calava "É que o meu Hugo, coitaditu, anda muito comichoso, coça coça coça... e é que aquilo está a ficar verde...e sai-le pús, e o pús dá-le muito desaconchego...bla bla bla bla bla bla bla bla bla bla bla bla bla bla bla bla" Obviamente que eu, nesta altura da conversa, já estou a contar os babados da renda de bilros em cima da mesa e a perguntar-me onde será que anda a Dona Luzinete.
Mas nem tudo são espinhos. É que, apesar de ficar a saber, invariavelmente, estar mais gorda, elas não se rogam a a fazer elogios. Provavelmente dizem-mo porque sou neta da joia da paróquia, mas não deixa de ser lisonjeiro. Sou inteligente, atinada, despachada, culta, sensível, um amor, um docinho, uma beleza...! UPA Upa puxadote...! E para isto basta dizer que tive uma vez um 20 numa prova global, que passei à primeira no exame de condução e que gostei muito de visitar a Catedral de S. Pedro no Vaticano. Pronto.
De resto, como não sair mais gorda da casa duma avó???

Ana Luelmo